20/09/11

À espera do famoso "clique" - Uma opinião


Em situações de avaliação psicopedagógica ou do desenvolvimento de crianças que nunca foram avaliadas anteriormente, apesar de, desde cedo, terem demonstrado dificuldades no seu desenvolvimento (numa área específica ou de uma forma generalizada) ou na sua aprendizagem escolar, ouço com muita frequência que os pais ou o pediatra ou a educadora de infância ou o professor estavam a aguardar pelo “clique”, que afinal não se chegou a dar (como se se tratasse de algo que surge do nada e, sem se dar por isso, resolve as dificuldades que a criança demonstrou até então), apesar de alguém (do já citados acima ou, com alguma frequência, os avós), já ter alertado para algo que não está bem.

O grande problema, na minha opinião (e na de vários colegas com quem tenho conversado sobre este tema), é que o famoso “clique” não é mais do que um mito associado aos “saltos” que se verificam ao longo do desenvolvimento convencional de uma criança – sempre que uma criança avança, de forma mais subtil ou evidente, no desenvolvimento ou aprendizagem de uma competência específica, diz-se que se deu o “clique”.

No entanto, estamos a falar de pequenos passos que fazem parte do desenvolvimento da criança e não de, perante uma criança que começa a demonstrar dificuldades e a “distanciar-se” em termos de desenvolvimento/aprendizagem, dos seus pares, aguardar de braços cruzados pelo tal “clique” ou salto (e este começa a ter de ser cada vez maior), que acontecerá em breve e resolverá a sua “imaturidade”.

Em conversas com educadores de infância e professores, há uma questão que surge com frequência: perante uma criança que lhes levanta alguma suspeita, deverão alertar os pais ou aguardar pelo “clique”? A minha primeira reacção, confesso, é o sorriso acompanhado pelo pensamento “lá vem o famoso clique” e, depois de desmontar este conceito com a educadora ou professora, transmito-lhe habitualmente a minha opinião: julgo que, tanto educadores como professores têm o dever de alertar os pais para qualquer situação que os preocupe relativamente ao desenvolvimento ou à aprendizagem de uma determinada criança.

Há, obviamente, várias formas de o fazer. Não precisam de ser alarmistas, pessimistas, nem avançar com possíveis diagnósticos baseados em experiências que possam ter tido anteriormente. Simplesmente utilizar o argumento (que pessoalmente considero valioso, especialmente vindo de alguém que passa tantas horas diariamente com a criança), de que comparativamente com o grupo (ou seja, com 24 outras crianças sensivelmente da mesma idade, expostas a um mesmo contexto escolar, e dando os relativos descontos ao facto de cada criança ter o seu ritmo de desenvolvimento e aprendizagem), aquela criança em particular não está a conseguir acompanhar os seus colegas numa ou noutra área e, por isso, valerá a pena tentar perceber o motivo para que se possa tentar ajudá-la a resolver as suas dificuldades atempadamente, não permitindo que se agravem e conduzam a limitações mais graves no seu futuro.

Haverá, por parte dos pais, reacções de todos os tipos. Para alguns será a confirmação de uma suspeita que já os persegue há algum tempo, para outros será uma surpresa e para alguns ainda será um completo disparate. Todos estes pais se preocuparão certamente com os filhos. Mais do que desinteresse ou negação, muitas vezes, trata-se simplesmente de uma diferença de estilos de personalidade que condiciona uma reacção diferente, seja esta em jeito de ataque, passividade ou defesa.

Mas se há algo a avaliar, que se avalie! Se há algo a fazer, que se faça! Se afinal, estamos perante um falso alarme e as notícias acabam por ser boas, com tudo dentro do esperado para a idade e nível de escolaridade, melhor ainda! Agora, aguardar de braços cruzados, fechar os olhos e esperar que passe, pode significar perder tempo valiosíssimo de intervenção. E esse, infelizmente, muitas vezes já não se consegue recuperar…

A grande questão que se põe é: na dúvida, valerá a pena correr esse risco?